Quando compramos algum produto, é comum que o vendedor ofereça seguros e acessórios, de que não necessariamente precisamos, em busca de aumentar sua comissão com a venda.
Com base nisso, a CVM australiana (ASIC) estudou as pessoas que contrataram seguros complementares ao adquirir veículos novos, a fim de compreender tanto as técnicas usadas pelos vendedores quanto a experiência de compra de tais produtos pelos consumidores.
Como o foco do estudo publicado no ano passado foram as experiências dos consumidores, foi utilizada uma metodologia de pesquisa qualitativa, envolvendo cinco grupos focais e treze entrevistas individuais com compradores de carros que contrataram seguro no momento da compra.
Os principais achados levam à conclusão de que as altas comissões pagas aos vendedores os incentivam a “empurrar” seguros, aumentando o custo final do carro para os compradores.
Em resumo, o estudo identificou nos compradores de carro:
- Despreparo para a compra: geralmente não possuem nenhum conhecimento sobre o seguro complementar quando vão comprar um carro;
- Fadiga / Sobrecarga de informação: quando chegam ao momento em que o seguro é oferecido, já estão exauridos pelo processo de compra (alguns se sentiram até pressionados pelos vendedores); e
- Dificuldade de recordar o processo de compra: muitos não conseguem lembrar qual seguro contrataram, quanto pagaram e quais itens o seguro cobria
Do ponto de vista da Psicologia Econômica, os principais achados foram:
Possíveis vieses | Comportamentos observados | Comentários |
Priming[1] | O seguro complementar só é oferecido aos consumidores no ponto de venda e após a compra do veículo. | O consumidor fica envolvido emocionalmente com o investimento que realizou na compra do carro. Por isso, está mais propenso ao gasto com o seguro do que estaria se este fosse oferecido antes da aquisição do veículo. |
Fadiga decisional | O seguro é oferecido ao final de um longo processo de compra. | A negociação e as decisões sobre o carro (modelo, cor, forma de pagamento, opcionais) deixam a pessoa cansada e com pressa para tomar novas decisões. |
Sobrecarga de informação | Os consumidores recebem muitas informações e precisam tomar várias decisões sucessivas. | Oferecer inúmeras opções de seguro junto com acessórios, após o consumidor ter tomado várias decisões significativas sobre a compra e o financiamento do veículo, dificulta a análise de cada oferta de seguro. |
Ancoragem | O consumidor acha que o preço do seguro é barato em comparação com o do carro que acabou de comprar. | Como o seguro é ofertado depois da compra do carro e custa pouco comparado ao valor do último, o consumidor deixa de analisar aspectos importantes da oferta, como a relação entre o prêmio e a cobertura oferecida. |
Enquadramento de preço/ contabilidade mental | O valor do seguro é oferecido em parcelas, ou seja, em termos mensais e não anuais. | Os consumidores podem subestimar o custo do seguro se o preço é apresentado como uma pequena despesa mensal, em vez de um custo total. |
Este estudo é consistente com pesquisas inglesas, as quais afirmaram que a oferta de seguro complementar pelos revendedores de veículos é uma venda de oportunidade para capturar o consumidor, no momento em que ele está vulnerável, para tomar esse tipo de decisão. Os estudos da Financial Conduct Authority (FCA) concluíram que o consumidor poderia ter uma economia de mais de 30% se resistisse à oferta feita no ponto de venda e fizesse uma cotação do mesmo seguro no mercado.
O estudo australiano mostra que o consumidor que contratou o seguro o fez simplesmente por conveniência e paz de espírito, ou seja, tomou uma decisão financeiramente ruim para evitar o trabalho extra de fazer pesquisa de preço e para se livrar da pressão do vendedor.
No entanto, o problema é maior do que simplesmente pagar mais caro, pois a compra irrefletida envolve ainda outras questões como a necessidade e adequação do produto. Basta imaginar a dor de cabeça do consumidor ao ter um sinistro e descobrir que pagou 15% acima do valor de mercado por um seguro que não cobre seu prejuízo.
Tudo isso acontece porque nem sempre conseguirmos nos conscientizar do quanto nossas decisões financeiras são afetadas pelas emoções e, mesmo sabendo disso, por sermos frequentemente incapazes de parar o processo no momento em que está acontecendo. Geralmente nos damos conta bem mais tarde, quando já não há como desfazer o negócio.
Uma das maneiras de nos prevenirmos contra isso é, por exemplo, refletir e pesquisar antes de partir para a compra, estabelecendo regras (não comprar seguro ou garantia estendida no momento da compra) ou limites (estabelecer um teto máximo para o valor do seguro).
Outra recomendação é pesquisar antes os preços de seguro e opcionais do veículo que decidir comprar para que o vendedor não tente ganhar de volta, com esses itens, o desconto a ser dado no preço do carro.
O mesmo raciocínio vale para outros produtos, especialmente os de valor elevado: ficar atendo a itens que sejam oferecidos como complementos e opcionais imediatamente após a compra, principalmente se oferecidos como uma oportunidade única que só pode ser aproveitada naquele momento, pois isso tem o objetivo de evitar que o consumidor pesquise por melhores ofertas.
Finalmente, se o negócio realmente parecer muito bom, peça alguns minutos ao vendedor e faça uma busca rápida no celular para ver se alguém fez alguma reclamação ou se há preços melhores no mercado.
E você? O que sugere para evitar uma compra impensada de complementos e opcionais? Conte para nós. Aguardamos seu comentário!
Fonte: CVM